Monday, July 25, 2011

UM CALCANHARESCO GOL DAS ARÁBIAS...



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GOL DE COICE
Para os poucos que ainda não viram o gol de calcanhar do Diab (Thyeb) Awana [foto]
ele está no Youtube, mais propriamente no URL 
[Clique na foto para ampliá-la]


UM CALCANHARESCO GOL DAS ARÁBIAS

Evandro da Nóbrega,
escritor, jornalista, editor.

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Este artigo é gentilmente transcrito pelos seguintes blogs e portais:

- Blog Cultural EL THEATRO, de Elpídio Navarro:
www.eltheatro.com

- Portal PS OnLine, de Paulo Santos:
www.psonlinebr.com

- Portal Literário RECANTO DAS LETRAS:
http://recantodasletras.uol.com.br/autores/druzz

- Blog DRUZZ ON LINE:
http://druzz.blogspot.com

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Há dias, me "consultaram", por e-mail, sobre a transmissão, em árabe, dos comentários de um locutor que acompanhava um jogo de futebol num país do vasto mundo arábico — quando, então, um dos jogadores cobrou um pênalti (e, pimba!, surpreendentemente o converteu em gol!). Surpreendentemente, sim, porque o jogador libanês fizera o gol, em penalidade máxima — mas chutando de calcanhar, dando um coice. Vocês devem ter visto no Youtube.
A “consulta”, partida de dois estimados amigos, era para eu dizer (logo eu!) se havia ou há algum palavrão nos comentários das Arábias feitos pelo narrador da partida. Se houvesse algo ofensivo, eles não colocariam o vídeo no ar. Canhestramente, respondi o seguinte:

   Escrita & Fala
Advertidos ficaram Vocês, pelo telefone: NÃO sou nenhum especialista em árabe. Apenas estudo a língua escrita (o chamado “Árabe Moderno Padrão”, de extração culta, mais aproximado do árabe clássico, o do Corão [Qur'an] — e bem diverso dos inúmeros dialetos falados, que, em alguns casos, se tornam perfeitamente ininteligíveis entre si.
Como minha intenção não é propriamente a de FALAR árabe (pelo menos num primeiro momento), apenas me envolvo, por enquanto, com a escrita, as palavras, as regras gramaticais. Dedico ao árabe o mesmo tempo que dedico ao hebraico — uma hora diária. É para não ficar “pendendo” nem prum lado, nem pro outro, nessa eterna e mui insana pendenga entre árabes, palestinos e israelenses.

   Transmissão Hilária
De todo modo, ouvi por diversas vezes a frenética narração, ou al-Hamaass ou, ainda, al-Hamyiyat, vale dizer, o “entusiasmo” do locutor esportivo. Pelo mínimo que entendo da língua falada, este dialeto do vídeo parece ser uma variedade própria dos Emirados Árabes, compreensível, inteligível em vasta área do mundo arábico, mas não ainda para mim!).
Escutei, escutei, escutei, prestando atenção nas palavras mais usuais ou repetidas — mas nada de ofensivo ouvi na narração, feita num dos falares que, não sendo o árabe padrão moderno culto, representa sem dúvida uma forma do árabe falado por pessoas razoavelmente educadas (interárabe, médio árabe etc).

“Gol” em Árabe 
Ao contrário, tais palavras soam bastante elogiosas ao autor do incrível gol de calcanhar [ka’b]. Dando seu histórico coice, o jogador enganou direitinho o goleiro [al-marma ou el-marmiy]. Gol, em árabe padrão moderno, pelo pouco que sei, é iSaaba, iSaabat — mas também al-háadef. Enfim, uns locutores árabes usam o termo al-háadef, outros o vocábulo góóóólll (sic, e não gôôôôl, com som fechado, como dizemos), quando se referem ao goal dos anglo-americanos, nosso gol.
Então, é al-hâdfel-hêdfil-hêdêf etc, dependendo do dialeto arábico.

Exemplo de Diglossia
Afinal, a língua árabe (ou, melhor, as línguas árabes) prima pela diglossia: variando de país a país, ou de região a região, os respectivos habitantes comunicam-se, no dia-a-dia, em um dos muitos dialetos do árabe padrão moderno — embora este último idioma seja a norma culta.
Nas transmissões de partidas futebolísticas, como tenho ouvido, usam-se também vocábulos como el-gwuloal-goulo, al gulo etc. E, dependendo ainda do grau de religiosidade do país, há locutores que até gritam um bem longo “Allaaaaaah!” [= “Deus”], mas que, por causa da influência das consoantes, nos soa como alóooo...

Haverá Palavrões?
A impressão de que houvesse palavrões em meio aos comentários do locutor [muudi’ — mas ele nada tem de mudo!] talvez advenha de uma das seguintes duas circunstâncias (ou da reunião delas):

  1) logo abaixo do vídeo, há uma referência ao blog Dirty Tackle (mas “Dirty Tackle”, ao pé da letra “obstrução suja”, corresponde apenas à nossa expressão “jogo sujo”);

 2) a ocorrência de palavra(s) parecida(s) com caralho [karay, karaya] na algavaria do locutor... embora ¡Ay, caray! ou apenas Caray!, em espanhol, também eufemismo para carajo, tenha hoje apenas o significado de nosso Caramba! 

Somente Conjecturas
Afinal, carajo tem de fato algo a ver com os árabes. Quando da invasão dos árabes à Espanha, logo disseminada por quase toda a Península Ibérica, os mouros eram chamados pelos hispânicos de cara de ajo [= "cara em formato de uma cabeça de alho", provavelmente por causa dos turbantes dos invasores]. A expressão logo se contraiu em carajo [pronunciado karárro], pelas leis da economia fonética.
No caso em discussão, o que se ouve como kara’i pode ser, quem sabe, uma forma verbal ou nominal de akara [= “cavar”]; ukar [= “bola (de jogar)”, plural ukra]; karas [= “burrice”, “estupidez”, daí provável e/ou previsivelmente karay = “burro”, “estúpido” (o goleiro)]; etc etc etc. Em verdade, não sei. Faço apenas conjecturas — com alguma base livresca, sim, mas conjecturas.

Transcrevam Isto!
Se dispusesse desse mesmo texto árabe, mas escrito (ou numa transliteração em caracteres latinos), quem sabe traduziria tudo isto numa tarde — com a ajuda de uns 20 dicionários de árabe, em papel ou em software, que vim adquirindo nos últimos meses, inclusive The Oxford English-Arabic Dictionary of Current Usage, de N. S. Doniach (saído pela Clarendon Press em 1972), com 1 mil 392 páginas; e o ótimo al-Kitaab fii Ta'allum al-‘Arabiyya, com seus DVDs, que lhe acrescentam funcionalidades como livro de texto para o aprendizado inicial da língua árabe.
Bem mais difícil seria verter, do árabe original clássico, um daqueles célebres livros do famoso viajante e intelectual tunisino/árabe/universal Ibn Khalduun (1332-1406) — que, em verdade e au grand complet, chamava-se Abwu Zayd 'Abdur-RaHman bin MuHammad bin Khaldwun al-Hadrami.

   Pausa Para Respirar...

Em tempo: Ibn Khaldwun foi um dos fundadores da Filosofia da História, da própria Historiografia, da Geografia Econômica e da Sociologia. Publicou em al-Qahirah, isto é, no Cairo, sua obra mais conhecida, Prolegômenos [al-Muqáddimah].

Outra obra sua, de muito destaque, é a História  — mas que originalmente se chamou, com licença das más palavras, Kitaabul-'ibaar wa diwaanul-mubtada' wal-Habar fyi ayyaamul-'arab wal-aajam wal-barbar wa man 'aasarahum min Dawlus-sultaanul-akbaar Akhbar wa-huwa taryikh waHyid ‘aSrih, Abd al-RaHmaan ibn Khaldwun al-Mughrabyi...

Quilométrico título, bem ao uso da época, que se pode livremente traduzir como "Livro das evidências, registro dos primórdios e acontecimentos dos dias dos árabes, persas e berberes, ao tempo do grande sultão e de seus poderosos contemporâneos, por Abdelramã, filho de Khaldwun, do Magrebe [parte ocidental da África do Norte] ".


O Cá-Cá-Cá Lá Deles
Outra coisa interessante: nos textos dos internautas, postados em língua árabe, no Youtube, comentando/criticando esse mesmo vídeo, o sinal هههههههههه (que aparece em algumas observações de internautas de extração árabe) não passa da repetição em série da consoante HÁ lá deles ["ه" = “há”, uma das últimas letras do alifato, o alfabeto árabe, com o som do H inglês].
Enfim, o HÁ é repetido por diversas vezes — justamente para imitar nosso kkkkkkkk ou hahahaha ou hehehehe... ;-)))

Beyruth versus Degolar...
Acho que não atendi à expectativa dos que me fizeram a solicitação — e é por isto que lhes enviei, a título de compensação, outro manual, em .pdf, pelo qual venho, a trancos e barrancos, aprender algo da língua árabe [al-arabyiyatun] todos os santos dias [‘ayyām al-awliyaa?]...
Mas é óbvio, como mostro logo em seguida, que jamais poderei ser um... tradutor juramentado, pelo menos do arábico idioma). Digo isto com absoluta certeza, porque, dia desses, meti-me a “traduzir” uma notícia dada por certo jornal árabe... E, ao final, argh!, por insuficientíssimo conhecimento da língua, fiquei sem saber se o Primeiro-Ministro do Líbano 1) chegara a Beirute — ou 2) fora degolado a machadadas!... Um amigo árabe do Recife (PE) me explicou: é porque Beirute degolar com machado têm a mesma raiz ancestral!... Como escrevem os árabes: هههههههههه, isto é, kkkkkk!...

Botem o Vídeo no Ar!
Enfim, coloquem o vídeo on line! Não vai ofender ninguém! Muito pelo contrário...
É o que vos drizz & até redrizz o Velho Druzz de Guerra, vulgo Evandrogol do Nobrecalcâneo...” 

P. S.: O título original do vídeo é هدف ذياب عوانه على منتخب لبنان  = "Gol de Diab Awana, do time libanês", com o subtítulo de "Reveja [a atuação de] Diab [ou Thyeb] Awana".

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