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PARA OS CAPÍTULOS DE HISTÓRIA
ECONÔMICA DA PARAÍBA
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O professor e escritor Emmanoel
Rocha Carvalho, da União Brasileira de Escritores, entidade com sede em São
Paulo (SP) [Favor
clicar na foto, para ampliá-la]
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Professor Emmanoel
Rocha Carvalho aborda importância do complexo Curema-Mãe d’Água e faz alerta às
autoridades
por
Evandro
da Nóbrega
escritor,
jornalista, editor
[druzzevandro@gmail.com]
Versão
algo diversa deste artigo (longo, bem escrito e revelador) do professor
Emmanoel Rocha Carvalho, da UBE (União Brasileira de Escritores), já foi
publicada pela revista literária GENIUS, editada pelo escritor e acadêmico Flávio
Sátiro Fernandes. O escrito do especialista — publicado logo em seguida a este
nariz-de-cera — é rico em informações de variegada natureza sobre o complexo hídrico
constituído pelas barragens de Curema (Coremas) e Mãe d’Água, no Alto Sertão
paraibano.
Além
disto, o Autor — que lançou recentemente um livro justamente sobre as barragens
de Curema e Mãe d’Água — aproveita o ensejo para invocar “a atenção das
autoridades responsáveis pelo gerenciamento dos recursos hídricos do Estado
para um controle mais rígido dos poucos (recursos hídricos) ainda disponíveis
nos dois reservatórios”.
— Igualmente
— diz o Dr. Emmanoel Rocha Carvalho — invoco o
Ministério Público para acompanhar, de perto, esse gerenciamento,
presente a possibilidade de prolongamento da estiagem, o que levaria o estado a
enfrentar sérios problemas de abastecimento d’água para consumo humano no
sertão. Ademais, faz-se necessário agir rapidamente para a eventual solução de
problemas suscitados no presente trabalho, especialmente os que dizem respeito
à qualidade das águas distribuídas para consumo humano e animal, focando,
prioritariamente, a saúde e as necessidades aquíferas desses seres, ao meu
sentir mais importantes que quaisquer outros interesses.
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A IMPORTÂNCIA DO COMPLEXO
CUREMA-MÃE D’ÁGUA:
CONSIDERAÇÕES
HISTÓRICAS
E SOCIOECONÔMICAS
por
Emmanoel
Rocha Carvalho,
da UBE-SP
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No
ano de 1911 o Presidente Hermes da Fonseca – eleito pelo Partido Conservador (PRC), para o período de 15.11.90 a 15.11.1914 –
autorizou a elaboração do megaprojeto do empreendimento. Era governador do
estado da Paraíba o Senhor João Lopes Machado, eleito para o período de
28.10.1908 a 22.10.1912.
O
projeto foi elaborado à época da antiga IOCS (Inspetoria de Obras Contra as
Secas), criada em 21.10.1909, tida como a mais adequada instituição para o
enfrentamento dos problemas trazidos com
as frequentes secas no Nordeste semiárido brasileiro durante longos anos.
Contribuíram com a sua elaboração técnicos americanos ligados ao US Bureau of
Reclamation, criado em 1902, agência americana voltada para abastecimento,
irrigação e hidrelétrica no Oeste do Estados Unidos.
Cabiam
à IOCS os estudos, predomínio de levantamentos e reconhecimentos da área, de
suas potencialidades e recursos naturais, missão de que se desincumbiu muito
bem, chegando, na sua curta existência, a construir algumas obras estruturantes
como estradas, pontes, pequenos açudes,
perfuração de poços, dentre outras. Foi ela sucedida pela IFOCS-Inspetoria
Federal de Obras Contra as Secas, através do Decreto 13.687/1919, com
atividades ampliadas, a exemplo de construção de grandes reservatórios, de
campos de pouso (aeroportos), portos, vilas operárias, escolas, além de
serviços de eletrificação.
Durante
sua existência, grandes açudes públicos da região Nordeste foram construídos,
marcados com a atuação de dois grandes presidentes:
1
- Epitácio Pessoa, eleito pelo Partido Republicano Mineiro (PRC), período de
28.06.1919 a 15.11.1922 e cujo governo autorizou a construção dos açudes
Boqueirão de Piranhas e São Gonçalo, na Paraíba, cujas obras somente foram
realizadas nos anos de 1932 a 1936); e
2
- Getúlio Vargas, colocado no governo pela Aliança Liberal (AL), período de
03.11.1930 a 29.10.1945 e, no segundo governo, pelo Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB), período de 31.01.1951 a 24.08.1954, quando se suicidou.
O Projeto Curema-Mãe d’Água
Por
motivos até hoje não bem esclarecidos, o governo de Epitácio Pessoa não foi o
responsável pela partida inicial da implementação do projeto, o maior elaborado
para a região Nordeste, contemplando, em especial, represamento de águas,
perenização de rios e irrigação. A sede do projeto – hoje
Coremas(PB), no alto sertão – dista 403 km da capital.
Elaborado
no governo de Hermes da Fonseca, durante muitos anos o projeto esteve
arquivado. Somente no governo de Getúlio Vargas ele foi lembrado e enquadrado
no Plano de Ação do presidente, assim mesmo, de forma tardia, certamente por
força do volume de recursos que demandaria a sua execução, uma vez que outros
projetos menores, no estado, foram ali contemplados (Boqueirão de
Piranhas, atual Barragem Engenheiro
Ávidos, com capacidade nominal de
represamento de 255 milhões de m3, iniciado em 1932 e concluído em
1936, no então município de Cajazeiras, e São Gonçalo, com capacidade nominal
de represamento de águas de 44,6 milhões de m3, iniciado em 1932 e
concluído em 1936, no município de Sousa). No meu entendimento, a inclusão do
projeto do complexo Curema-Mãe d’Água no
Plano de Ação do presidente Getúlio Vargas deveu-se ao empenho do grande
estadista paraibano José Américo de Almeida, que era Ministro da Viação e Obras
Públicas.
O
projeto Curema-Mãe d’Água era gigante, formado por dois grandes açudes, o de
Curema, com quatro barragens de terra (a maior, com 1.550 km, com uma proteção
interior de uma cortina central de
concreto armado, e revestimento de cimento em toda extensão, a montante; e com capacidade nominal de represamento de
águas de 720,0 milhões de m3) e o de Mãe d’Água, com uma única
barragem, de concreto ciclópico (com capacidade nominal de represamento de
638,0 milhões de m3), sendo que esta seria o sangradouro do referido
complexo hídrico.
Para
se ter uma ideia da dimensão do referido complexo (1,36 bilhão de m3)
é bastante reportar-se à capacidade da barragem Gramame/Mamoaba, no município
do Conde, de 56,9 milhões de m3, e que abastece cerca de 60% da
região metropolitana da capital do
estado, aqui entendida como João Pessoa, Cabedelo e grande parte de Bayeux.
Vale esclarecer que a referida barragem recebe águas, também, de rio
perenizado.
Dados técnicos da barragem de Curema
O
coroamento (extensão) da barragem principal, como foi visto, é de 1.550 m; a
bacia hidráulica é de 5.950 ha; a bacia hidrográfica é de 6.840 km2 e a altura
máxima é de 47 m; o volume de terra
zoneada com cortina central de concreto armado é de 2.687.530 m3.
Com a inclusão das três barragens auxiliares, são acrescentados – embora
dispersos - ao coroamento 945 m e ao
volume, 76.040 m3 de terra; o
rio barrado é o Rio Piancó.
Os
dados sobre a bacia hidrográfica – área captadora das chuvas, cujas águas são
direcionadas para a barragem - vêm sendo
hoje contestados, havendo informações oficiais
que levaram o escritor Francisco Teotônio de Sousa a registrar no seu
livro PIANCÓ – O Pequeno Grande Rio -
edição da Editora Universitária, da UFPB, João Pessoa, 2008 - que a mesma é de
9.242,75 km2.
Entendo
que o atual desenvolvimento tecnológico concernente confere mais credibilidade aos atuais
instrumentos de medição (o projeto data
do início do século passado). A bacia hidráulica é aquela formada pela lâmina
d’água represável/represada, de medição pouco menos complexa.
Objetivos do projeto do complexo
Dentre
tantos objetivos, o projeto do complexo focava
a perenização dos rios Piancó, Aguiar e Piranhas, na Paraíba, e Açu, no
Rio Grande do Norte, bem assim a
irrigação das várzeas de Sousa, na Paraíba, então estimadas em 20.000 ha, e das várzeas do baixo vale do Açu, no Rio
Grande do Norte, estimadas em 25.000 ha.
O
foco central do plano era dirigido para o barramento do Rio Piancó, com
nascente no riacho Santa Inês, ao sopé
da serra da Baixa Verde, no hoje município de Santa Inês (PB), a 120 km do
local onde seria construída a primeira grande barragem, de Curema, no boqueirão
do mesmo nome, na Serra de Santa Catarina; numa segunda etapa, seria barrado o
Rio Aguiar, com nascente no local Timbaúba, no então município de Itaporanga (PB), a 80 km da
barragem de concreto a ser construída no boqueirão de Mãe d’Água, na mesma
serra de Santa Catarina, a cerca de 3,7 km do
boqueirão de Curema.
Com
a construção das várias barragens (quatro no açude Curema e uma no açude Mãe d’Água),
as águas represadas destinar-se-iam à dessedentação humana e de animais,
irrigação, e perenização dos referidos
rios, com o que se produziria alimentação barata, inclusive peixes, para as
comunidades adjacentes e carentes, além de
manter a população no interior dos sertões envolvidos (Paraíba e Rio
Grande do Norte).
Como
a irrigação principal seria dirigida às várzeas de Sousa (e do baixo Açu), o
projeto previa a construção de um canal para o açude de São Gonçalo, que
alimentaria as necessidades aquíferas das referidas várzeas. Seria uma obra de
elevado custo, mesmo porque contemplava construção de longo canal, de 45 km,
com elevação e construção de túneis no percurso, estes com 15 km de extensão.
A Longa Execução do Projeto
A
história da IFOCS é rica de feitos marcantes, de estudos e obras estruturantes
na região do semiárido do Nordeste brasileiro, por longo tempo
esquecida. Para o êxito do seu grande papel, aquela inspetoria criou várias
comissões técnicas, a exemplo da Comissão Técnica de Reflorestamento e Postos
Agrícolas do Nordeste, e Comissão Técnica de Piscicultura, em 1932. No ano de
1935 criou a Comissão do Alto Piranhas, para construir os açudes Curema e Mãe
d’Água, e as primeiras obras de
irrigação do açude São Gonçalo, além de trechos de estradas de Curema a Catolé do Rocha e Sousa
a Curema, via São Gonçalo. Sua sede foi fixada em Curema.
A
execução do amplo projeto foi entregue ao Dr. Estevam Marinho, rio-grandense do
Norte, nomeado Chefe da Comissão do Alto Piranhas. Diferentemente do que muitos
pensaram por longos anos, ele era geógrafo. Graduou-se engenheiro civil somente
em 1948, juntamente com o seu filho Luciano Marinho, em Recife(PE), em pleno
exercício da chefia daquela referida Comissão.
O
local escolhido para a construção do primeiro dos dois grandes açudes foi o
boqueirão de Curema, juntinho do povoado
Boqueirão de Curema. Acredito que o nome Curema se traduza numa
homenagem à valente tribo Coremas, da nação Cariri, que teria povoado, nos
séculos XVI e XVII, parte do estado de Pernambuco e extensa região do Vale do Piancó, chegando
até os boqueirões da Serra de Santa Catarina.
No
capítulo I, “Da povoação de Curema ao início da construção da barragem”, do livro
BARRAGENS DE CUREMA E MÃE D’ÁGUA – Nos
bastidores da construção, edição do Autor, João Pessoa, 2013, de minha
autoria, procurei mostrar, claramente, que o nome da barragem é Curema. Pelo
Decreto-Lei 1.164, de 15.11.1938, o distrito de Curema é alterado para Coremas
e com este nome foi mantido com a Lei 1.005, de 30.12.1953, que criou o
município, cuja instalação se deu em 04.04.1954.
A construção da barragem de Curema:
1ª. etapa operacional do complexo
Grandes
dificuldades foram enfrentadas para a construção da grande barragem (local
pobre, de diminuto povoamento (estimei, para o ano de 1935, uma população
de 500 pessoas, com argumentos
expendidos na minha obra citada), de estradas carroçáveis precárias e, como
consequência, um pequeno comércio, desprovido de quase tudo, o que, de início,
já se constituía num grande desafio para o Dr. Estevam Marinho.
O
Dr. Estevam Marinho partiu para as primeiras e acertadas providências. Logo
instalou à margem esquerda do Rio Piancó, juntinho do boqueirão da Serra de
Santa Catarina , o acampamento que abrigaria o sistema IFOCS-Curema, separado
da sede do povoado, que ficava à margem direita do mesmo rio. Não pensou duas
vezes, deu celeridade, entre as construções de obras de infraestrutura, à
edificação de casas que viriam abrigar
as famílias dos engenheiros e dos funcionários técnico-administrativos, além de
113 casas na vila operária, para pessoal semiqualificado; ao lado desses
serviços, em 1936 foi criada a Cooperativa de Consumo dos Funcionários do
DNOCS, e iniciados os trabalhos de escavação profunda no boqueirão, para a
formação da base principal de fundação
do açude Curema, no local onde hoje está a galeria.
Em
março de 1937 — às vésperas do início da construção da barragem, ocorrido em
abril seguinte — estavam concluídos o projeto urbano e o de obras estruturais
(construção do almoxarifado, casa de força, do escritório central, redes
elétrica, hidráulica e sanitária,
hospital e maternidade, grupo escolar, hotel, casa de hóspedes e grandes
prédios e galpões para abrigar garagens e oficinas, instalação de
serviços de radiotelegrafia e telefonia, além de linda capela, devotada a Santa
Terezinha, para aliviar as carências espirituais dos moradores do acampamento.
Na
parte sócio-desportiva, segundo antigos moradores que residiram no citado
acampamento, fazia gosto ver funcionar
aquilo tudo previsto no projeto, mas de uma forma muito melhorada, graças à
visão e o sentimento do Administrador Chefe: parque esportivo-social
constituído de grande piscina, campo para tênis (segundo o tenista José do Patrocínio de Oliveira Lima, meu
saudoso amigo e ex-colega no BB, o acampamento da IFOCS chegou a sediar, na
década de 1940, campeonato Norte-Nordeste, na modalidade, o que me levou a
admitir que o esporte chegou a Curema bem antes de chegar a João Pessoa), campo
para vôlei e basquete, e clube social.
O
campo de futebol foi construído em espaço diferente, junto ao final da vila
operária, nem por isso deixando de ser um primor. Ah, como deve ter sido bom
aquele tempo! Faço tal juízo porque eu cheguei a utilizar os mesmos
equipamentos comunitários a partir de
1947, já contando seis anos e frequentando a escola (Grupo Escolar Arrojado
Lisboa). Ali vivi uma infância da adolescência feliz, junto dos meus pais, irmãos e amigos, estudando, brincando, pescando, caçando e
criando pássaros.
As vantagens da construção
tardia da barragem de Curema
Como
foi visto anteriormente, o projeto Curema-Mãe d’Água só foi desarquivado quando
os projetos de Boqueirão de Piranhas e o de São Gonçalo estavam em adiantada
execução, já próximos da finalização. Estes foram concluídos em
1936, e puderam liberar mão-de-obra experiente para a grande barragem de
Curema (topógrafos, auxiliares de topografia, mecânicos, serralheiros, carpinteiros
etc.).
De
outro lado, os projetos de Boqueirão de Piranhas e de São Gonçalo contrataram, no início da
construção dos açudes, um número elevado de operários, porquanto foram
utilizados trabalhadores atrelados a animais no transporte de materiais, durante
boa parte da execução dos serviços. Esse transporte foi substituído nos dois
últimos anos das construções por patrulhas mecanizadas, que foram parcialmente liberadas
para o início da construção da barragem de Curema. Por isso, embora a execução
do projeto tenha sido iniciada tardiamente, a barragem de Curema foi
significativamente beneficiada, ao contar, de partida, com mão-de-obra
qualificada e experiente, além de
equipamentos modernos.
Com
os serviços de infra-estrutura e de fundação concluídos — iniciados em 1935 e
terminados em março de 1937 —, foi a
construção da barragem iniciada,
efetivamente, em 08.04.1937, segundo o historiador Cristovam de Abreu, no seu
livro CONJUNTO ESTEVAM MARINHO,
edição dos familiares (sob a minha coordenação), João Pessoa, 2014. Na obra,
são tratadas, em versos, as construções das barragens Curema e Mãe d’Água,
sendo de destacar que o Sr. Cristovam exerceu, com competência, a função de
topógrafo nas citadas barragens, tendo sido grande servidor da IFOCS/DNOCS por longos
anos. De outro lado, considerada a grande dimensão do empreendimento, a IFOCS
chegou a utilizar, conjuntamente, seis engenheiros, espalhados pelas diversas
frentes de trabalho, no inicio da grande obra.
Pelo
gigantismo do empreendimento e dificuldades financeiras enfrentadas pelo país,
com uma então economia focada, consideravelmente, na exportação de commodities
agrícolas, a obra caminhava lentamente, mesmo porque, antes e durante muitos
anos, o Nordeste semiárido do Brasil não
era uma prioridade nacional. Era sempre lembrado – e quase somente isso – nos
períodos de grandes estiagens, de mortes de pessoas e animais, dentre outras
ocorrências nefastas. Somente na seca de 1877, que se estendeu a 1879 e que foi
chamada de a “Grande Seca”, morreram mais de 500.000 pessoas no estado do
Ceará e regiões circunvizinhas.
A
construção do complexo foi iniciada sob a administração da IFOCS, com o
aparelhamento singelo mas com a forte atuação em favor da referida região,
calcada na competência dos seus servidores. A referida IFOCS recorria sempre ao
US Bureau of Reclamation, dos Estados Unidos,
para obter cooperação na solução de problemas técnicos enfrentados, já
que aquele país contava com experiência no trato com região semiárida
semelhante em alguns estados daquela
grande Nação. E o que é mais importante,
socorria-nos e nos oferecia tecnologias novas na área. Um exemplo disso é sua participação na elaboração do
projeto do complexo e o socorro que nos
prestou no açude de Boqueirão de
Piranhas, em 1972, para solução de problemas técnicos na barragem e no
sangradouro.
Em
1938, a IFOCS autorizou a instalação de um Laboratório de Solos e Concreto, no
acampamento em Curema, que chegou a prestar serviços a obras da autarquia em
outros estados do Nordeste brasileiro. Teria sido o primeiro laboratório da
espécie no país, o que não consegui comprovar
em pesquisas efetuadas. Instalou, também, um lindo e confortável prédio
(para os padrões da época), onde eram exibidos filmes interessantes, em sessões
noturnas, sem nada dever aos mostrados em regiões desenvolvidas do país. Era o
Cine CAP (Comissão do Alto Piranhas), que muito o frequentei na minha
infância/adolescência.
A
barragem de Curema mereceu visitas de
pesquisadores, turistas e autoridades nacionais, dentre elas os Presidentes Getúlio Vargas, em 16.10.1940,
e Eurico Gaspar Dutra, em 01.10.1949; em julho de 1955 visitou-a o general
Juarez Távora em campanha eleitoral para a presidência da República, em disputa
com Juscelino Kubitschek de Oliveira.
Este a conheceu quando veio inaugurar a barragem de Mãe d’Água e a hidrelétrica
de Coremas, em 15.01.1957.
Com
muitas dificuldades, a barragem de Curema foi
concluída em 08.05.1942, sem festas e sem inauguração. Uma tristeza!
Naquela época o país se encontrava envolvido com interesses, no meu
entender, muito delicados, diante da
ocorrência da 2ª. Guerra Mundial (1939/1945). Em fevereiro de 1942 o Brasil
teve embarcações comerciais torpedeadas
pelos países do Eixo, em represália à sua adesão aos compromissos da
Carta do Atlântico, que previa o alinhamento automático com qualquer nação do continente americano que fosse
atacada por uma potência extracontinental.
Entendo
importante registrar que ao término da construção da barragem, Coremas contava
com população urbana em torno de 2.500 pessoas, bem superior ao número de 500
pessoas estimado por mim no início da obra, por ocasião da pesquisa realizada
para a produção do livro Barragens de Curema e Mãe d’Água, já citado. De outro
lado, como citado no mesmo livro, a Revista
Brasileira dos Municípios (no. 30, ano VIII, 1955) informa que a população
de Coremas era de 2.982. A justificativa que entendo para o número de 2.500 em
maio de 1942, é que as obras do complexo estiveram paralisadas durante sete
anos.
Ao
reinício das obras, com a construção do açude
Mãe d’Água, pouca gente foi recrutada, cerca de 130 pessoas, segundo
escreveu Raimundo Carvalho (mestre de obras naquela barragem, 1949/1957), em relatório manuscrito que produziu para mim, a partir da sua prodigiosa
memória, aos 91/92 anos, informações contidas no meu livro citado. Por fim,
registro que os insumos adquiridos pela autarquia responsável pela construção
eram adquiridos, na expressiva maioria, em centros comerciais do estado e de
estados vizinhos. É possível que tudo isso, naturalmente, tenha impedido um
crescimento significativo da população entre 1942 e 1955.
Paralisia na construção do
Complexo Curema-Mãe d’Água
O
projeto esteve paralisado durante vários anos, por motivos já conhecidos. Nem
por isso o acampamento da IFOCS foi dissolvido. As casas permaneciam ocupadas,
com o engenheiro Chefe e auxiliares
qualificados e experientes, aguardando o reinício das obras do complexo, ou
seja, a construção da barragem de Mãe
d’Água.
Foi
um período de mansidão, de descanso para aqueles que deram tudo de si para
verem construído o primeiro açude, que
soltava águas pelas comportas, no período seco, e pelo Riacho Seco, afluente do Rio Aguiar, em
tempo de chuvas – quando a barragem enchia -, para irrigar culturas
ribeirinhas, da Paraíba ao Rio Grande do Norte.
Os
serviços de piscicultura eram ampliados; o açude recebia novos alevinos, com o
que o povoamento total era composto de pirarucu, tucunaré, curimatã, piau,
traíra, cangati, cascudo, apaiari e até (não sei porque) piranha. Tilápias e
pescadas, só décadas depois.
Caía
por terra a esperança de levar águas do complexo para as Várzeas de Sousa,
mesmo a longo prazo, em decorrência do enfraquecimento, durante a segunda Guerra Mundial, de várias
nações compradoras de produtos da
pauta das exportações brasileiras.
Sob
o ponto de vista técnico, até que foi válida a interrupção da construção do
complexo. O projeto foi revisto e se chegou à conclusão que o encaminhamento
das águas para as várzeas de Sousa, a partir da conclusão da barragem de Mãe
d’Água, seria inviável, pela forma com que fora inicialmente planejado - via
açude São Gonçalo -, devido ao alto
custo das obras do canal e as dificuldades financeiras do país durante a guerra
mundial antes referida.
Barragem
do açude Mãe d’Água – 2ª etapa operacional do complexo
Dados técnicos da barragem
O
coroamento (extensão) é de 175 m; a bacia hidrográfica é de 1.128 km2; a bacia
hidráulica é de 3.844 ha; a altura máxima é de 35 m; o volume de concreto
ciclópico é de 95.100 m3 e o rio barrado é o Rio Aguiar.
Já
citado, o relatório produzido por Raimundo Carvalho registra 45 m para a altura
da barragem e 95.000 m3 para o volume de concreto ciclópico,
enquanto o relatório de Cristovam de Abreu — que serviu de base central do seu
livro publicado, Conjunto Estevam Marinho — registra 49,05 m para a altura e
91.242 m3 para o volume de concreto ciclópico, isso tudo depois da
barragem concluída.
Sobre
a bacia hidrográfica, fineza considerar as justificativas apresentadas logo
após os dados técnicos da barragem de Curema.
A construção da barragem de Mãe
d’Água
“...
em outubro de 1941, teve início a locação; em 1943, início da barragem em
fundação e; e em 10 de outubro de 1948, a concretagem em ação. Foi com esses três versos que o escritor e topógrafo
Cristovam de Abreu ofereceu importantes informações à história da construção da
barragem, no seu livro, já citado, Conjunto Estevam Marinho, informações essas
não fornecidas nem tampouco confirmadas por antigos funcionários da IFOCS, em
Coremas, à época da construção, nem no
Distrito do DNOCS (que sucedeu à IFOCS), em João Pessoa, nem, ainda,
na Sede do Órgão, em Fortaleza, em 2013, quando pesquisei bastante para
a pesquisa do meu livro já citado. Uma
lástima!
Não
duvido das palavras do incansável e competente topógrafo Cristovam de Abreu.
Pelo contrário, tenho muita crença nelas e louvação em
tudo que ele fez. Isso tanto é verdade que incluí o seu nome numa
diminuta e muito bem selecionada lista de HOMENS ÍNTEGROS, no meu último livro, recém editado, VANDONY DANTAS – Um exemplo de integridade.
Era Cristovam de Abreu um homem honrado, competente e simples. Muito
respeitado. Era também, sem fazer alardes,
sobrinho do grande historiador Capistrano de Abreu, de muitas obras publicadas
e um dos mais respeitados e antigos escritores
sobre a história do Brasil.
Pelo
espaçamento das datas citadas pelo Sr. Cristovam, há de se imaginar que a obra
também foi atingida por paralisações, certamente por escassez de recursos
financeiros.
Em
28.12.1945, pelo Decreto-Lei nº 8.486, é criado o DNOCS (Departamento Nacional
de Obras Contra as Secas), sucedendo à IFOCS e que nasceu com enriquecido
acervo de obras e estudos técnicos e científicos das antigas IOCS e IFOCS. A
novel Instituição (considerada secular, computando também os anos de funcionamento da IOCS e IFOCS),
outrora prestigiada e atuante no semiárido nordestino, encontra-se hoje sem o
necessário apoio governamental.
A
primeira concretagem da barragem foi iniciada em 1948, tendo como mestre de
obras o Sr. João de Paiva, sobre quem Cristovam de Abreu registrou muito boas
referências no seu livro já várias vezes citado. Naquela época, continuava no
comando da Comissão do Alto Piranhas o Dr. Estevam Marinho. Os serviços de
concretagem eram realizados em reiterados espaços de três dias e três noites,
ininterruptamente, fato que exigia a presença do mestre de obras na empreitada,
chamada, naquele tempo, de “virada”, numa alusão à virada do dia para noite,
trabalhando.
Surpreendentemente,
meu pai, Raimundo Carvalho — que prestara relevantes serviços na construção da
barragem de Curema —, foi procurado em casa, em setembro de 1949, por emissário
do Dr. Estevam Marinho, que solicitava a presença dele no seu Gabinete. Da
conversa, resultou um convite para acompanhá-lo numa viagem à obra. No dia
seguinte, uma séria conversa no trajeto
de ida e volta (cerca de 8 km), com intervalo para mostrar a construção.
Na
oportunidade, Dr. Estevam Marinho lhe segredou que não estava satisfeito com o
andamento dos serviços, que liberava muito dinheiro e que os serviços não
correspondiam ao esperado. Finalizou, dizendo, “preciso do senhor para assumir
a função de mestre de obra da construção da barragem do Mãe d’Água”.
Meu
pai, surpreso, disse: “Como, logo eu que estou exercendo função de almoxarife e
que pouco conheço sobre cimento armado?”
O Dr.
Estevam Marinho, arrematando, falou: “O senhor, sim! Venho acompanhando seus
serviços há anos e tenho informações que o senhor já esteve várias vezes no
Laboratório de Solos e Concreto, no afã de conhecer os serviços ali praticados.
Pense sobre o meu pedido”.
Semanas
depois o Sr. João de Paiva se afastou da condução da obra, alegando necessidade
de ir morar em Natal e dar educação aos filhos. Diante disso, Raimundo
Carvalho é guinado à função de mestre de
obras da grande barragem de Mãe d’Água, em dias de outubro de 1949. Com isso,
estava sepultada a vida mansa de almoxarife e diminuídas as atividades de lazer
que tanto amava, a caça e a pesca. Em contrapartida, ganhava carro com
motorista, telefone e uma grande área
para plantio, nos fundos da casa onde morávamos, com cerca de 3 ha. Foi muito
bom para a família, e para o Dr. Estevam Marinho, acredito.
Os
trabalhos em ação faziam Raimundo Carvalho e o Dr. Estevam Marinho felizes.
O
Dr. Estevam Marinho, que padecia de problemas cardíacos, convenceu o médico Dr.
Firmino Ayres Leite — que morava em Piancó — a vir residir em Coremas,
assegurando-lhe residência confortável no acampamento do DNOCS, ao tempo que
invocava a necessidade de cuidados especiais, já que sua sede residencial era
em Recife, onde permanecia a sua esposa, conduzindo mais de perto a educação
dos filhos. Dr. Firmino também era político e escritor.
Quando tudo corria bem, em 1952 o Dr. Estevam Marinho foi nomeado
Chefe do 2º. Distrito do DNOCS, em João Pessoa-PB, sendo substituído pelo
adjunto, Dr. Egberto Carneiro da Cunha,
seu fiel amigo, que conhecia bem a
capacidade do mestre de obras e tinha por ele grande admiração; por isso,
manteve Raimundo Carvalho no cargo.
Em 23.02.1953 faleceu em João Pessoa o Dr. Estevam Marinho, cujo corpo foi sepultado em Recife (PE), onde morava sua família.
O Dr. Egberto, fiel aliado do Dr.
Estevam Marinho era, como ele, portador de problemas de saúde. Em decorrência
disso, retornou em 1955 para Fortaleza — de onde viera há anos — para cuidar da precária situação da saúde. Foi
substituído por um engenheiro jovem, Dr. Ivanildo Marinho Cordeiro Campos,
egresso da sede do DNOCS, em Fortaleza, com pouca ou quase nenhuma experiência
em concreto. Talvez por isso, manteve Raimundo Carvalho no cargo de mestre de
obras da barragem. Sua passagem por Mãe d’Água foi meteórica; não consegui
apurar os motivos.
Foi ele substituído por um outro jovem engenheiro, o Dr.
Vitoriano Gonzalez y Gonzalez, também inexperiente em serviços de concreto e em
administração de grandes obras. Vinha, em 1955/56, do pequeno açude Escondido, com barragem de
terra, no município de Brejo do Cruz-PB, com capacidade nominal de
armazenamento d’água de apenas 16,6
milhões de m3. Certamente uma
promoção. De cara, via-se diante da administração da maior barragem de concreto
em construção pelo DNOCS, projetada para 640 milhões de m3, o que se constituía
em grande desafio. Talvez por isso, meu pai, já amadurecido conhecedor dos
serviços de concreto e de condução da obra, permaneceu no cargo de mestre de
obras, dando a sua indispensável colaboração.
Por ato ministerial, a barragem de
Curema passou a se chamar de barragem Estevam Marinho, conforme ofício do Sr.
Diretor Geral do DNOCS, de número 636 T, de 03.06.1955, o que foi traduzido
como homenagem merecida ao saudoso construtor, respeitável administrador e
acreditado engenheiro. É uma tristeza que a barragem continuasse a ser chamada
de Curema depois da homenagem. Ele não merecia isso! Hoje, até o DNOCS, quando
se reporta à barragem Estevam Marinho traz, entre parênteses, a expressão
“ex-Curema”.
Com
as sucessivas mudanças de engenheiros na
direção da construção da barragem de Mãe d’Água, Raimundo Carvalho era cada vez
mais exigido, explorado diante dos seus
conhecimentos em concreto. A sorte dele veio com a execução do plano
governamental do Presidente Juscelino Kubitschek (eleito em 1955),
denominado Plano de Metas, que previa ações de cinquenta anos em cinco.
Nesse diapasão, foi incluído o açude de
Mãe d’Água entre aquelas grandes obras inauguráveis em 1956, com o que recursos
financeiros para a obra passaram a aportar celeremente.
Acreditava meu pai
que isso lhe exigiria muito mais, todavia, em compensação, após o ato inaugural
poderia descansar longamente. Esse seu desejo não foi satisfeito. Após a inauguração,
com serviços de acabamento ainda em curso, foi ele convocado pelo DNOCS para
realizar serviços de concreto na adutora de Campina Grande e, depois, nos
açudes Banabuiú e Orós, no Ceará, onde se aposentou na
autarquia.
Segundo
me afirmou Raimundo Carvalho, mestre de obras da barragem de Mae d’Água, no
período de 1949 a 1957, muitos engenheiros e acadêmicos de engenharia visitaram a barragem durante quase todo o
período da sua construção, sendo ele, a partir de 1949, sempre indicado para prestar esclarecimentos e
informações sobre a respeitável obra de cimento ciclópico, a maior do DNOCS.
Entendo até que aquela obra era vista como um centro tecnológico de concreto do
Nordeste, pelo muito que instruiu centenas
de estudiosos e pesquisadores que por lá passaram. No final de 1955, a barragem
de Mãe d’Água, em construção, já barrava o Rio Aguiar, afluente do rio Piancó,
desaguando neste antes do encontro do rio Piranhas com o Piancó, nas
proximidades de Pombal (PB).
Diante
da impossibilidade da construção do canal partindo da barragem de Mãe d’Água
para o açude São Gonçalo, a Diretoria do DNOCS mandou elaborar projeto de
construção/instalação de uma hidrelétrica
na barragem de Curema, já que a água que estava sendo solta com destino
ao Rio Grande Norte era suficiente para fazer funcionar a referida
hidrelétrica.
Ela foi imediatamente construída e inaugurada juntamente com a
barragem de Mãe d’Água. Do seu funcionamento, resultou fornecimento de energia
elétrica para várias cidades do sertão, a partir de Coremas; depois, Piancó, São Gonçalo, Sousa, Cajazeiras,
Patos, Catolé do Rocha e Itaporanga, segundo Cristovam de Abreu, no livro já
citado, Conjunto Estevam Marinho.
Para a realização dos serviços de distribuição da energia, foram gastos
consideráveis valores com aquisição de transformadores, postes e linhas de
transmissão de alta tensão. No final de 1969,
esses serviços, à exceção dos de Coremas, foram absorvidos pela CHESF,
segundo o engenheiro Evandro Souza Araújo,
Chefe do Órgão em Coremas (a referida hidrelétrica foi desativada em
2014, quando produzia energia só para o município).
Paralelamente
à realização dos serviços finais para a inauguração da barragem de Mãe d’Água,
foi construído o canal vertedouro na região Riacho Seco, através do qual as
águas do açude Curema se interligam com as do açude de Mãe d’Água. Na verdade são dois reservatórios
distintos, barrando rios distintos. Só com abundância de chuvas nas suas
cabeceiras os açudes se interligam, na cota 237, formando um imenso
reservatório, com capacidade nominal de 1,36 bilhão de m3.
Essa
capacidade está hoje reduzida, efetivamente, para 1,16 bilhão de m3,
segundo serviços de batimetria realizados nos dois açudes em dezembro de 2013,
de que resultou uma capacidade nominal de 591,6 milhões de m3 para
Curema e 568,0 de m3 para Mãe
d’Água, tudo por força de assoreamento de muitos anos. Esses serviços de
batimetria (determinação do relevo do fundo da área lacustre) tornaram-se
necessários a partir da inclusão dos dois reservatórios dentre aqueles que,
espera-se, receberão águas do Rio São Francisco, com a transposição de suas
águas para reservatórios receptores nos estados de Pernambuco, Ceará, Paraíba e
Rio Grande do Norte.
Pessoalmente
e diante das gravíssimas dificuldades
financeiras por que passa o país – com possibilidades de se manterem e/ou se a
agravarem nos próximos semestres – e as hídricas no Nordeste, não acredito que
as águas do São Francisco cheguem aos açudes de Curema e de Mãe d’Água nem tão
cedo, ainda mais porque a crise hídrica por que passa a região do semiárido
nordestino vem ocorrendo desde 2012 e já há registros midiáticos de
estudos sobre a possibilidade do seu
prolongamento.
Finalmente,
depois de inaugurada a barragem, com a presença do Presidente Juscelino
Kubitschek, em 15.01.1957, estava concluído, em termos de represamento de
águas, o complexo Curema-Mãe d’Água, que
se constituía no maior reservatório público construído pelo DNOCS, no Nordeste,
então com capacidade nominal de represamento de 1,368 bilhão de m3 .
Outros
grandes reservatórios lhe seguiram, também construídos pelo DNOCS, tomando a
sua hegemonia: açude Orós (barragem
Juscelino Kubitschek de Oliveira), no Ceará,
com 2,1 bilhões de m3,
concluído em 1961; açude Açu (barragem
Armando Ribeiro Gonçalves), no Rio Grande do Norte, com 2,4 bilhões de m3,
concluído em 1963; açude Banabuiú (barragem Miguel Arrojado Lisboa), no Ceará,
com 1,7 bilhão de m3, concluído em 1966; e o último — resultado
de uma
parceria do governo do Ceará/DNOCS —, o açude Castanhão (barragem Padre
Cícero), no Ceará, com 6,7 bilhões de m3, concluído em 2002. Todos
esses reservatórios, inclusive os que integram o complexo Curema-Mãe d’Água, apresentam baixos
níveis de represamento, devido à prolongada estiagem na região semiárida do
Nordeste, desde 2012.
A
barragem do açude Mãe d’Água, anos depois, em data que não consegui apurar,
passou a ser denominada de Barragem Egberto Carneiro da Cunha, homenagem do DNOCS a um dos seus
construtores. Para minha tristeza, tal como ocorreu com a homenagem prestada ao
Dr. Estevam Marinho, que emprestou o nome à barragem do açude Curema, os nomes
dos engenheiros construtores foram esquecidos. As duas barragens continuam
conhecidas, no âmbito externo do DNOCS, como Curema e Mãe d’Água, sendo mesmo,
e oficialmente, Barragens Estevam Marinho e Egberto Carneiro da Cunha,
respectivamente.
Registro
que o cuidadoso povoamento de peixes no reservatório de
Curema – tão bem executado e acompanhado pelo saudoso Estevam Marinho –
foi um sucesso até poucos anos depois do falecimento do grande construtor
Chefe. Não sei se sua decadência deveu-se à omissão e/ou desinteresse da Chefia
da Comissão do Alto Piranhas, ou pela falta de recursos para manter ativo e
equilibrado o referido povoamento. O fato é que o município de Coremas se
tornou grande produtor e distribuidor de
peixes durante muitos anos, incluindo os dois açudes.
A
pesca predatória ali exercida era afrontosa, sem fiscalização na década de 50.
Lembro-me bem, quando adolescente e antes de deixar o município em 1957, para
residir em Campina Grande, presenciei nos reservatórios centenas de pescadores
do local, do Ceará e do Rio Grande do Norte, atuando livremente, sem atropelos
de quaisquer fiscalizações. Isso foi um
grande mal. Aos poucos o município de Coremas ia passando da condição de
produtor e exportador para a de importador e distribuidor de peixes, como hoje
se encontra, adquirindo pescados no Ceará, provenientes, na maioria, do açude
Castanhão, já que os reservatórios do complexo Curema-Mãe d’Água — outrora
comprovadamente piscosos — encontram-se praticamente despovoados das diferentes
espécies.
Projeto de irrigação das
várzeas de Sousa (PIVAS)
Com
a eleição do sousense Antônio Marques da Silva Mariz para governador do estado
(1995-1999), o projeto de irrigação das várzeas de Sousa voltou à tona. Ele
assumiu os primeiros estudos e encaminhamentos, contudo, em vista do seu falecimento
precoce em 17.09.95, as ações iniciais pareciam caminhar para o esquecimento.
Não
foi isso o que aconteceu; com a posse do seu vice, o Dr. José Targino Maranhão,
o desejo de Antônio Mariz foi honrado e o canal que levaria águas da barragem
de Mãe d’Água para o município de Aparecida (PB), praticamente nos portões das várzeas, de 37
km, foi construído. Com isso, finalmente as várzeas de Sousa receberiam as tão
esperadas águas do açude Mãe d’Água.
Em
2004 — quando já existia a grande barragem de Açu, no município do mesmo nome,
no estado do Rio Grande do Norte, e não se vislumbrava o período de longa
estiagem que enfrentamos —, foi editada pela ANA (Agência Nacional de Águas), a
Resolução nº 687, de 03 de dezembro, que dispõe sobre o Marco Regulatório para a gestão
do Sistema Curema-Açu e estabelece
parâmetros e condições para
emissão de outorga preventiva e de direito de uso de recursos hídricos e declaração de uso
insignificante.
A
referida resolução cita, nos “considerandos”, o Convênio de Integração
celebrado entre a ANA, os estados da Paraíba e do Rio Grande do Norte, e o
DNOCS, para a gestão integrada, regularização e ordenamento dos usos dos recursos hídricos na bacia do
rio Piranhas-Açu, em particular, do Sistema Curema-Açu. No Art. 2º
estabelece a vazão máxima
disponível de 27,30 m3/s
considerada para o Sistema Curema-Açu, sendo 6,4 m3/s na Paraíba (o Conselho Gestor posteriormente criado para
gerir as águas do Sistema Curema-Açu
limitou as vazões de Mãe d’Água para as várzeas de Sousa em 2,0 m3/s e em 4,4
m3/s a vazão do açude Curema para a Paraíba e o Rio Grande do Norte, através
dos rios Piancó e Piranhas) e 20,9 m3/s no Rio Grande do Norte.
O
parágrafo único do Art. 5º estabelece
que a ANA deverá delegar para os estados da Paraíba e do Rio Grande do
Norte competência para emitir outorgas no Sistema Curema-Açu. Esse sistema é
compartilhado com o Sistema Piranhas-Açu, pelo encontro dos rios Piancó e
Piranhas, na região do Areial, bem próxima da cidade de Pombal (PB). Apenas no parágrafo único do Art. 1º da
citada Resolução 687, no item I, o açude de Mãe d’Água é citado, nestes termos:
“Trecho no. 1: Curema. Corresponde ao perímetro da bacia hidráulica dos reservatórios Curema e Mãe d’Água. Trecho
localizado integralmente no Estado da Paraíba”.
Durante
a fase de pesquisa, feita nos primeiros meses de 2013, para produção do livro
Barragens de Curema e Mãe d’Água, constatei que em Dez/2012 a vazão do açude
Mãe d’Água era de 1,9 m3/s e a estimada do açude Curema estava em torno de 3,5
m3/s. Recentemente, obtive informações extraoficiais junto à Coordenadoria Estadual do DNOCS, na
Paraíba, de que a vazão autorizada para as várzeas de Sousa, a partir do açude
Mãe d’Água, é de cerca de 0,82 m3/s, inclusive cerca de 0,17 m3/s para a
adutora de Sousa, a ser inaugurada; a do
açude Curema, de cerca de 2,0 m3/s, é destinada
aos estados da Paraíba e do Rio Grande do Norte.
O
que é mais grave e me preocupa bastante, é que essas vazões atuais ocorrem num
momento muito difícil, diante de: a) perspectivas de prolongamento da atual e
preocupante estiagem na região das
bacias hidrográficas dos dois açudes, Curema e Mãe d’Água; b) baixo nível de
disponibilidade de águas nos dois reservatórios, respectivamente de 15,1% e de
18,6% (posição em 10.09.15 - fonte: AESA-PB).
Com
a realização da pesquisa, em 2013, para
a produção do meu livro citado Barragens de Curema e Mãe d’Água — que
trata, também, sobre o PIVAS – e com a experiência de ex-analista de projetos
agroindustriais na alta Direção Geral do BB em Brasília, à época do PROÁLCOOL,
visitando, no mais das vezes, bases agrícolas dos projetos em diversificadas
regiões do país, firmei juízo no referido livro
sobre a temática, sobre o precário funcionamento do projeto em 2012,
quando já consumia considerável volume de água do açude Mãe d’Água. Cheguei a listar algumas informações e/ou
considerações pertinentes no referido livro, adiante resumidas:
- os
recursos destinados ao PIVAS (parceria do governo estadual com o federal)
totalizaram R$ 160,5 milhões e corrigidos pela IPCA, a preços de maio de 2013,
atingiam a 351,9 milhões.
- a
área do projeto, de 6.335,74 ha, contempla, principalmente, 992,53 ha
destinados à implantação de 179 lotes para colonos, ao que fui informado, já
ocupados; 2.336,32 ha destinados a 19 lotes empresariais, sendo 03 ocupados e,
ainda, 1.007,30 ha destinados ao INCRA,
para assentamento de 141 famílias (que estariam hoje ocupados; por outro lado, o Projeto de Irrigação do
Perímetro de São Gonçalo, com área irrigável de cerca de 3.000 ha, foi
implantado há muitos anos nas várzeas de Sousa, muito próximo da região onde se
instalou o PIVAS, e que chegou a ser
orgulho para o DNOCS nas décadas de 50/70, encontra-se hoje abandonado, sem água, sem crédito e sem
rumo, com os cerca de 450 experientes
irrigantes entregues à própria
sorte; o açude São Gonçalo – que o alimentava – encontra-se com apenas 5,7% da
sua disponibilidade aquífera, fonte
AESA, 10.09.15, dirigidos para
Sousa-PB);
- em
novembro de 2012, foi remetida pelo açude Mãe d’Água uma vazão de 1,9 m3/s;
apenas 0,96 m3/s chegou ao PIVAS
(desperdício de 49%, causado por furto de águas em 122 pontos do canal);
- as
terras utilizadas pelo PIVAS não seriam as melhores das várzeas de Sousa
(opinião do experiente agrônomo Dr. José Furtado da Silva, ex-técnico e ícone
do DNOCS, Mestre em Fitotecnia pela Escola de Agronomia de Piracicaba, com
vários estágios e treinamentos no exterior, que trabalhou no Projeto de
Irrigação do Perímetro de São Gonçalo e que conhece muito bem a constituição
das terras das várzeas, segundo me afirmou);
- diminuto
uso de mão de obra em 2013 (776 empregos
diretos, contra 15.000 do projeto).
Destacada importância benéfica
no uso das águas de Curema
Dentre
os benefícios do complexo Curema-Mãe
d’Água, listarei aqui somente aqueles que considero de grande alcance social;
no passado:
a)
desenvolvimento populacional, educacional/cultural/esportivo/turístico,
econômico e religioso no antigo e atrasado povoado do Boqueirão de Curema – a
população, que era de cerca de 2.500 pessoas ao término da construção do açude,
em 1942, hoje está acima de 15.000
habitantes;
b) produção e distribuição de energia elétrica
para várias cidade do sertão;
c)
fornecimento de águas para irrigação de terras
ribeirinhas do estado e do Rio Grande do Norte (apurei junto ao DNOCS que
os 2,0 m3/s liberados pelo açude Curema
não chegam ao grande açude Açu-RN); e
d)
produção e distribuição de pescados
próprios (hoje, continua centro distribuidor, porém de pescados de outras regiões).
Dentre
benefícios do presente e de um passado recente, cito a utilização de águas
por 25 municípios/distritos do alto
sertão paraibano, bem assim por
populações ribeirinhas do estado e do Rio Grande do Norte, sem falar em
incontáveis carros-pipas que as
distribuem nas zonas rurais.
Vejamos
os 25 municípios/distritos beneficiados, a partir de pontos, minissistemas e
sistemas adutores, seja no próprio açude ou nos rios Piancó e Piranhas (este,
também perenizado, a partir do encontro com o Rio Piancó): Areia de Baraúnas,
Assunção (serviços já concluídos mas ainda não ativada a adutora), Belém de
Brejo do Cruz, Brejo do Cruz, Cacimba de Areia, Cajazeirinhas, Catolé do Rocha,
Condado, Coremas, Malta, Patos, Paulista, Passagem, Piancó, Pombal, Salgadinho,
Quixaba, Santa Gertrudes, Santa Luzia, São José de Espinharas, São José do
Sabugi, São Mamede, São Bentinho, São
Bento, Várzea e Vista Serrana. Ao todo, cerca de 180.000 pessoas são assistidas
pelo sistema Curema-Açu. Tem-se como certa a adutora de Sousa, a ser inaugurada
proximamente, com água de Mãe d’Água.
Informações
colhidas em Coremas dão conta de que a água da cidade foge ao controle da
CAGEPA e as águas do açude estariam poluídas, o que — é de se apurar — constitui-se em
ameaça à saúde dos usuários locais e dos atendidos pelo sistema adutor
originário do açude Curema.
Como
último registro sobre os dois açudes, informo que a primeira sangria do complexo Curema-Mãe
d’Água ocorreu entre a noite do dia 19 e a madrugada do dia 20.03.1960, segundo
me passou o saudoso amigo de infância,
José Virgulino Guerra, conceituado servidor do DNOCS/CHESF, que esteve presente
a tão importante momento histórico.
Nesta
oportunidade, invoco a atenção das autoridades responsáveis pelo gerenciamento
dos recursos hídricos do estado para um controle mais rígido dos poucos ainda
disponíveis nos dois reservatórios. Igualmente, invoco o Ministério Público para acompanhar, de perto,
esse gerenciamento, presente a possibilidade de prolongamento da estiagem, o
que levaria o estado a enfrentar sérios problemas de abastecimento d’água para
o consumo humano, no sertão. Ademais, faz-se necessário agir rapidamente para a
eventual solução de problemas suscitados no presente trabalho, especialmente os
que dizem respeito à qualidade das águas distribuídas para o consumo humano e
animal, focando, prioritariamente, a saúde e as necessidades aquíferas desses
seres, ao meu sentir mais importantes que quaisquer outros interesses.
Ao
finalizar, manifesto o entendimento de que se outros benefícios não resultaram
do megacomplexo é porque o homem não deu o exemplo que era esperado para a
proteção da sofrida região semiárida do Nordeste do nosso Brasil. A propósito,
permito-me transcrever as contundentes e apropriadas palavras que um dos mais
inteligentes, competentes e respeitados cientistas do quadro do DNOCS, o
engenheiro Dr. Miguel Arrojado Ribeiro Lisboa
em 28.08.1913, no Clube de
Engenharia do Rio de Janeiro, ao discursar sobre soluções para mitigar os
graves efeitos das secas no nosso semiárido nordestino; encerrou a palestra
assim:
“[...]
Chegamos, assim, ao mais grave de todos os problemas: o da educação! Só ela,
unicamente ela, permitirá que o povo goze
de sã higiene, aprenda a aperfeiçoar a irrigação, promova a indústria
compatível com a ambiência, adote a fenação e use o silo, não abandone o gado e
melhore-lhe a raça, facilitando-lhe a
água não contaminada, desenvolva as culturas nas grandes várzeas irrigadas,
abra por si poços, faça pequenos açudes, compreenda, enfim, a importância desse
grande esforço que está sendo empregado em prol do seu bem estar”.
______________
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